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Quem enfrenta facção criminosa não se preocupa com MP, diz criador de site sobre PCC

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O guarda civil Rícard Wagner Rizzi Pereira da Mota, 53 anos, mantém um site sobre o Primeiro Comando da Capital (PCC), a maior facção criminosa do Brasil desde 2011. Praticamente desconhecida, a página ganhou destaque há poucos dias devido a uma reportagem do site Ponte Jornalismo. Com visual poluído e textos carregados de referências pretensamente filosóficas, a página trata de temas diversos, como o fracasso do combate ao tráfico na fronteira ou a vida solitária das mulheres dos membros da organização. 

O trabalho que Mota faz quando não está de farda é monitorado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Ele pode ser acusado de apologia ao crime, mas diz não ter receio. “Acha que quem corre o risco de enfrentar represália de uma facção vai se preocupar com o Ministério Público?”, diz. Ele afirma já ter sido ameaçado tanto por membros do PCC quanto por agentes da segurança pública.  

Mota diz que, em meados de janeiro, no auge da crise do sistema prisional, seu número de telefone foi adicionado em grupos de WhatsApp do PCC. Diz não saber como isso aconteceu, mas que aproveitou a chance: parte do conteúdo publicado em seu site, segundo ele, foi retirado das mensagens que leu neles. É o caso do estatuto, da cartilha ou ainda do dicionário de gírias da organização. São documentos conhecidos das autoridades: cada vez que um novato entra para o PCC, os veteranos entregam a ele os textos – em geral escritos à mão – num ritual de batismo. Mota afirma que não pediu para entrar e que foi excluído dos grupos seis meses depois.  

ÉPOCA – Por que o senhor decidiu fazer um site sobre o PCC?
Rícard Wagner Rizzi Pereira da Mota –
 Inicialmente, o site não tinha nada a ver com o PCC. Primeiro foi montado para servir de apoio à Associação de Guardas Civis Municipais. Depois fiz algumas crônicas de ficção. Posteriormente, comecei a trabalhar no Fórum e percebi que qualquer cidadão podia ter contato com os processos. Então usava minhas folgas para ler os processos e fazer as matérias em cima das informações. No mesmo esquema que faço hoje: nem a favor do criminoso, nem a favor das forças de segurança. Mas sim colocando os dois pontos de vista. Tem um investigador aqui em Itu que fez um trabalho espetacular sobre o PCC. Isso me rendeu muitos artigos.

ÉPOCA – A audiência do seu site cresceu recentemente. O senhor ganhou dinheiro?
Mota –
 Antes o site dava R$ 0,10 por dia. Não pagava nem a energia elétrica. No dia que mais rendeu, quando saiu de 500 para 30 mil leitores, deu R$ 50.

ÉPOCA – O senhor recebe críticas por escrever sobre o PCC?
Mota –
 Uma das principais críticas que tenho recebido é justamente por ter colocado a cartilha, o estatuto e o dicionário do PCC. Em tese, esses três documentos seriam secretos. Eu já tinha publicado o estatuto há muito tempo. Mas cada vez que encontrava uma versão diferente, trocava no site. Um dia acabei tropeçando, dentro de um grupo do pessoal, com essa versão atualizada.

ÉPOCA – Grupo de que pessoal?
Mota –
 Num grupo do PCC, né? Hoje não participo mais. Devido ao meu site, eles me adicionaram. Eu nunca pedi para entrar, nem para sair. Procurava nem olhar.... As regras do PCC são muito complicadas. Você precisa ter um extremo cuidado. O risco é muito grande. Para pedir para sair, eu teria de dar um monte de explicações. Então preferi esperar que me tirassem do grupo.

ÉPOCA – Por quem o senhor foi adicionado? Um dia acordou e seu telefone estava num grupo do PCC?
Mota –
 Basicamente isso. Eu fiquei por uns seis meses só. Eu até evitava entrar, mas quando precisava de alguma informação até dava uma olhada. Em nenhum momento peguei nenhum dado comprometedor... Investigação cabe à Polícia Civil, não a mim.

ÉPOCA – Quem te adicionou chegou a te apresentar para o restante do grupo?
Mota –
 Não. Quando vi eu estava lá. Um ou outro escreveu “bem-vindo”, esperando que eu falasse alguma coisa. Mas eu não falei.

ÉPOCA – Como o senhor sabia que eram grupos do PCC?
Mota:
Existe um sistema de verificação dentro do próprio grupo. Mas esse é um detalhe que não cabe a mim te passar.

ÉPOCA – O senhor chegou a trocar mensagens quando estava no grupo?
Mota – 
Eu não gosto de me esconder. A única coisa que fazia era colocar o link das matérias do meu site. E saía. Não ficava circulando lá. Evitava ao máximo.

ÉPOCA – Quando o senhor pegava informações do grupo, avisava que ia publicar?
Mota –
 Não pedi autorização, e nunca ninguém me cobrou dentro dos grupos. O que estava acontecendo, e até me preocupou, é que algumas versões do estatuto colocavam que a polícia era alvo de ataque. Diziam que matar a polícia era uma obrigação. 

ÉPOCA – O senhor denunciaria para a polícia se descobrisse algo ilícito?
Mota –
 A questão ética é muito complicada. Se eu descobrisse alguma coisa que cabe à Polícia Civil investigar, eu jamais colocaria (no site). Por mais que os caras sejam criminosos, não seria correto. 

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ÉPOCA – O senhor foi adicionado em mais de um grupo?
Mota –
 Ah, foram vários. Foram vários. 

ÉPOCA – Por que o senhor acha que foi adicionado?
Mota –
 Não sei quem me adicionou. Só sei quem me excluiu. Porque ele entrou em contato e perguntou o meu RG, que é como eles perguntam quem é a pessoa. Então eu mostrei o site e disse que não havia solicitado a entrada, mas que poderia ver meu procedimento através do que eu havia escrito. Deve ter dado certo, porque ninguém me fez nenhuma cobrança.

ÉPOCA – Qual foi sua reação quando foi adicionado aos grupos?
Mota –
 Não gostei. Me adicionaram pela primeira vez durante aqueles ataques nos presídios, em janeiro deste ano. Eu estava fazendo matérias mostrando as atrocidades feitas em cima do pessoal do Primeiro Comando da Capital. Depois veio o caso do Rio Grande do Norte, que também foi uma atrocidade em cima do pessoal do Primeiro Comando. Acho que foram dois ou três grupos. O pessoal nesses grupos preza muito a lealdade, a amizade... Mas o clima é tenso, porque a vida deles é tensa. Qualquer coisa mal dita ou mal interpretada gera um estresse tremendo. Boa parte dos que estão nos grupos está dentro dos presídios. Imaginou a tensão?

ÉPOCA – O senhor teve medo quando foi adicionado? Ficou receoso por ter sido encontrado?
Mota –
 Tensão sempre tem, né? A qualquer momento que um dos lados resolver, né... Não sei quem me adicionou, mas se o PCC quisesse, já teria me matado. Eu não escondo meus dados. Você acha na internet com bastante facilidade o meu site. Eu trabalho nas forças de segurança pública. A gente enfrenta o risco de morte todos os dias. 

ÉPOCA – Já foi ameaçado?
Mota –
 De quando em quando, alguém faz algum comentário na internet. Sou ameaçado dos dois lados. Tanto policiais achando que sou do PCC, quanto do pessoal do PCC achando que trabalho a favor da força policial. Mas só de maneira indireta. É interessante que as cúpulas, tanto do PCC quanto da polícia, não se incomodaram comigo. Se tivessem se incomodado, já teriam tomado as providências, né?

ÉPOCA – O senhor já fez sites sobre outras facções?
Mota –
 Nunca me interessei.

ÉPOCA – O senhor é acusado de fazer apologia à organização. O que acha disso?
Mota:
Os dois lados dizem que sou o diabo na terra.

ÉPOCA – Por que o senhor continua com o site?
Mota –
 Por que não vou continuar? É um trabalho interessante....

ÉPOCA – Mas é perigoso também....
Mota – 
Perigoso é.  

ÉPOCA – Por que continuar, então?
Mota –
 Não seria por isso que deixaria de publicar, não teria lógica, eu acho. A morte não vem para todo mundo? Quem trabalha no meu ramo pode morrer a qualquer momento. Cada vez que saio na rua corro risco.

ÉPOCA – O senhor está sendo monitorado pelo Ministério Público de São Paulo. Não tem receio de ser processado?
Mota –
 Isso é de se esperar, né? Processo é óbvio que vai vir, não tenho dúvida - seja dentro da Guarda ou pelo MP. Agora você tem de convir comigo: quem corre o risco de enfrentar represália de uma facção vai se preocupar com o Ministério Público? O risco é bem maior.

 



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