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Daniel Rezende, um malabarista por trás das câmeras

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Daniel Rezende é um homem ocupado. Aos 42 anos, tem no currículo 15 filmes nos quais trabalhou como montador. No último mês, lançou Bingo – O rei das manhãs, sua primeira e brilhante incursão como diretor. Na última sexta-feira, dia 15, Bingo foi escolhido para representar o Brasil no Oscar. Enquanto finalizava o longa-metragem, já estava envolvido nas gravações da nova série da Netflix sobre a Operação Lava Jato, prevista para estrear em 2018. Em meio a tudo isso, ainda encontra tempo para trabalhar no roteiro e na escolha do elenco do filme da Turma da Mônica. Numa tarde de agosto, ÉPOCA testemunhou a azáfama que é a vida de Rezende. Chegara meia hora atrasado para a entrevista por ter ficado preso numa reunião por telefone com sua agente. Agitado, pediu desculpas e emendou um aviso a uma assessora: havia terminado de editar um trailer e não aguentaria esperar pela aprovação. Ao final da entrevista, interrompido por telefonemas sobre a série da Lava Jato, ele ainda faria a avaliação do elenco para a Turma da Mônica.

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A agenda de Rezende começou a ficar abarrotada em 2002, quando montou seu primeiro grande filme, Cidade de Deus, dirigido por Fernando Meirelles. Pelo trabalho, recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Edição e arrebatou o Bafta (o Oscar inglês) na mesma categoria. Tinha apenas 28 anos – para colocar em perspectiva, o diretor mais jovem da história a receber o Oscar foi Damien Chazelle, aos 32. “Montador é daquelas profissões que você não consegue explicar direito para os seus pais”, brinca Rezende. Ele conta que, ao assistir a seu primeiro trabalho, o pai lhe disse: “Eu não sei o que você fez, mas sinto que fez direito!”. Um montador edita as cenas para que fiquem tão bem costuradas que prendam a atenção do espectador. Seu pai estava certo. O reconhecimento por Cidade de Deus abriu-lhe as portas do mundo do cinema. Desde então, Rezende trabalhou com grandes cineastas brasileiros como Walter Salles, Cao Hamburger, José Padilha e Laís Bodansky, além de Terrence Malick, grande diretor americano.

Bingo é baseado na história de Arlindo Barreto, o primeiro ator a interpretar o palhaço Bozo no Brasil. Na estreia como diretor, Rezende recorreu muito às experiências pessoais para fazer o filme. Cria dos anos 1980, ele desenvolveu um fascínio pela década definida por Raul Seixas como a charrete que perdeu o condutor. “Vi nessa história uma bela oportunidade para mostrar o que era a anarquia e a loucura da televisão naquela época”, diz. Além do politicamente incorreto que reinava até mesmo em programas infantis – e da Gretchen, claro –, Rezende recuperou com saudosismo peculiaridades da época como o tracking do videocassete, o aquaplay e os penteados esvoaçantes.

 

Foi na meninice que Rezende deu os primeiros sinais do caminho que viria a trilhar. “Minha mãe dizia que, quando eu não tinha nada para fazer, enquanto as outras crianças queriam ir para a piscina, eu preferia ver televisão”, afirma. O gosto pelo cinema o levou a almejar a carreira de diretor. “Passei bastante tempo procurando um projeto especial. Eu me apaixonei pela carreira de montador – que não pretendo parar –, mas desde 2008, quando fiz Blackout, meu primeiro curta, queria dirigir.” Ele esbarrou com a história de Arlindo Barreto ao ler uma reportagem. Interessou-se pelo personagem, que buscou desenfreadamente a fama, mas acabou se tornando o famoso mais anônimo do Brasil – por uma cláusula contratual que o impedia de revelar que era o Bozo. “O Arlindo trazia esse recorte do artista, que é o exemplo máximo de uma história muito humana da busca das pessoas pelo reconhecimento”, diz.

Por orientação dos pais, Rezende  se formou em publicidade e propaganda, em vez de cinema. Saiu da cidade de Guarulhos, em São Paulo, onde cresceu, para estudar na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). A decisão, na verdade, o aproximou da cinematografia. Daniel não saía do laboratório de edição de vídeo da faculdade. Depois de estagiar no canal de TV experimental da instituição de ensino, saiu à procura de estágios em produção. Por sorte, a produtora de Fernando Meirelles estava precisando de mãos ágeis.

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Após alguns anos na edição de propagandas, foi chamado para a montagem de um filme. “Eu nem era a primeira opção do Fernando! Mas acho que o destino estava trabalhando a meu favor”, afirma Rezende. Ninguém imaginava que Cidade de Deus, com uma história tão violenta e com um estilo de edição ousado, faria tanto sucesso. No ano seguinte ao lançamento, Rezende recebeu um e-mail de Meirelles informando que ele havia sido selecionado para o Bafta. “Mal sabia o que era esse prêmio”, diz. “Só percebi o que estava
acontecendo quando peguei o avião com Halle Berry e vi o Martin Scorsese sentado a minha frente no evento.”

Naquela noite, o prêmio de Melhor Edição foi o primeiro a ser entregue. Rezende subiu ao palco atônito, sem ter sequer um discurso pronto. “Mal falava inglês! Enquanto inventava meia dúzia de frases, olhei a plateia e foquei na Catherine Zeta-Jones”, diz. “Não tirei os olhos dela. Mas aí percebi que o Michael Douglas estava do lado e pensei que talvez não fosse uma boa ideia.” Depois de ganhar o prêmio, Rezende precisou ir à sala de imprensa, dar entrevistas e tirar fotos. “Claro que, sem saber falar a língua deles, ninguém deu muita bola para mim.” Para retornar à plateia, Rezende precisava sair do teatro e dar a volta. O segurança, pensando que ele era um penetra, tentou impedir sua entrada – mas Rezende estava segurando o prêmio na mão. Uma cena parecida acontece em Bingo.

Rezende diz que, ao finalmente entoar o brado “luz, câmera, ação!”, tentou repetir sua experiência com Meirelles. “O Fernando sempre teve tino para formar a melhor equipe e extrair dela o que há de melhor”, diz. “Me inspirei nele.” Como o capitão de um navio, Rezende sabia que precisava distribuir ordens e afazeres, mas procurou ouvir seus subordinados, a quem chama de “coautores do filme”. “O Daniel é detalhista, perspicaz e muito atento ao elenco. Parecia que trazia um metrônomo na cabeça, sabia a dinâmica exata de cada cena”, afirma o ator Vladimir Brichta, que interpreta o palhaço Bingo e é um dos destaques do filme.

“O Dani sempre se interessou por aspectos dos filmes que vão além da montagem. É natural que ele comece a dirigir cada vez mais”, afirma José Padilha, diretor de Tropa de elite, Tropa de elite 2 e Robocop, cujas montagens Rezende assinou. “Ele é um perfeccionista que faz mil coisas ao mesmo tempo.” Padilha está trabalhando com Rezende na série sobre a Lava Jato. Bozo foi o palhaço que reinou nas televisões brasileiras na década de 1980. Rezende é o malabarista que pretende equilibrar nos próximos anos o audiovisual brasileiro nas mãos.

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